A maconha não foi liberada, após o Supremo Tribunal Federal (STF) descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. Pela palavra “descriminalização”, a medida logo gerou interpretações equivocadas, inclusive entre políticos e parlamentares. E o Judiciário tampouco atropelou o Congresso, uma vez que não criou uma lei, apenas orientou a interpretação do que já há de existente na legislação brasileira. O GGN explica abaixo.
“Deixar bem claro que não estamos em nenhum momento fazendo um liberou geral, fazendo uma liberação de drogas para fins recreativos. A premissa nossa é que a droga causa danos, sim, às pessoas e que as pessoas precisam ser tratadas quando são viciadas”, manifestou o ministro Gilmar Mendes.
A decisão do STF nesta semana de descriminalizar o porte de maconha gerou ampla repercussão entre políticos e sociedade, com a consequente disseminação de informações falsas nas redes sociais.
Isso porque o Judiciário não legalizou o porte e a posse de drogas, mas descriminalizou, e especificamente da maconha, em uma quantidade pequena, considerada de uso pessoal.
A diferença entre “legalização” e “descriminalização” ocorre porque portar drogas ainda é ilegal no Brasil, conforme prevê a Lei de Drogas (Lei 11.343/2006). Mas a pena estabelecida na legislação, criada pelo Congresso e aprovada pelo Executivo, refere-se ao tráfico de drogas e entorpecentes, regulamentando entre 5 e 15 anos de prisão para o crime. A mesma lei não explicita que portar drogas seja crime.
Com a legislação não clara sobre o assunto, atualmente cabia aos juízes de primeira instância e de Execução definir se uma pessoa seria presa ou não por portar drogas, o que permitia uma variedade de decisões judiciais, nenhuma delas equivocadas, mas tampouco padronizadas.
Por isso, o julgamento do Supremo foi sobre se portar a maconha seria um crime com pena de prisão, assim como ocorre com o tráfico e produção, entre outros crimes relacionados às drogas, ou somente um ilícito, passível de processo administrativo. A decisão da Corte foi por esta última interpretação.
Mas a decisão não significará que portar drogas e consumir em locais públicos será permitido. E a produção para venda ainda serão considerados crimes com penas de prisão.
“É bom deixar bem claro que em todos os votos que nós trouxemos ninguém partiu da premissa de que a droga é positiva. Pelo contrário, estamos afirmando que se trata de uma infração e que é necessário que haja tratamento às pessoas viciadas”, afirmou o relator Gilmar Mendes.
A diferença foi enfatizada, diversas vezes, pelos ministros ao longo do julgamento. “O plenário do STF, por unanimidade, considera que o consumo de drogas ilícitas é uma coisa ruim e que o papel do Estado é combater o consumo, evitar o tráfico e tratar os dependentes”, expôs o presidente da Corte, Luis Roberto Barroso, na leitura do resultado final, nesta terça-feira (25).
A decisão do Supremo tampouco foi uma interferência no que corresponde ao papel do Legislativo: o do Congresso de criar leis. Porque a legislação já existe, mas havia um limbo no qual não estava especificado se portar drogas para uso pessoal era crime.
Nesse sentido, a PEC das Drogas – um projeto no Congresso que pretende proibir a posse de qualquer quantidade de drogas e entorpecentes no Brasil, é que atropelará o Judiciário, com o que já definiu sobre a legislação existente.
“A PEC que criminaliza o uso da maconha cria um novo conceito na crise entre os poderes na democracia, o ativismo legislativo ou a legislação abusiva”, manifestou o constitucionalista Pedro Serrano, em suas redes.
Serrano lembrou que o STF esclareceu que “tipificar como crime o porte para uso de maconha” é uma ofensa a um direito fundamental. “Logo PEC que vá contra isso estará ofendendo cláusula pétrea, restringindo inconstitucionalmente a extensão concreta de um direito fundamental, não há como ter qualquer sustentação.”
Na prática, se aprovada, a PEC das Drogas será inconstitucional e poderá ser invalidada no Supremo Tribunal Federal (STF). “O parlamento não pode criminalizar qualquer conduta segundo sua vontade”, expôs.
“O Legislativo invade competência do STF quando quer ser a palavra final de qual é o sentido da Constituição e quer por o poder político acima da Constituição e de seu guardião legítimo. Ativismo legislativo ofendendo a competência do STF, legislação abusiva”, exclamou o jurista.
Fonte: Jornal GNN por Patricia Faermann