A juíza Carolina Lebbos rejeitou, na madrugada desta quarta-feira (30), o pedido para que o ex-presidente Lula saísse da prisão temporariamente, para acompanhar o velório e o enterro de seu irmão Genival Inácio da Silva, conhecido como Vavá.
Vavá morreu aos 79 anos em São Paulo, em decorrência de um câncer no pulmão. Ele será sepultado nesta quarta, às 13h, em São Bernardo do Campo (SP).
Lebbos, responsável pela execução da pena de Lula, tomou a decisão após ouvir a Polícia Federal, que considerou que havia riscos em uma eventual saída temporária do petista de Curitiba, onde está detido desde abril.
“Este Juízo não é insensível à natureza do pedido formulado pela defesa. Todavia, ponderando-se os interesses envolvidos no quadro apresentado, a par da concreta impossibilidade logística de proceder-se ao deslocamento, impõe-se a preservação da segurança”, escreveu ela em decisão. Lebbos disse ainda que o deslocamento de Lula poderia até afetar os trabalhos humanitários feitos em Brumadinho (MG) após a tragédia da última sexta-feira (25).
A defesa de Lula ainda havia peticionado nesta terça 29 ao TRF (Tribunal Regional Federal) para obter a saída temporária. O juiz responsável, porém, disse que só se posicionaria após a manifestação de Carolina Lebbos.
Os advogados haviam citado em seu pedido para conseguir a liberação dele para ir ao velório do irmão, outra decisão da Justiça Federal sobre o petista, que o impediu de ir ao velório de um amigo.
Justiça negou pedido de Lula para ir ao velório do irmão, Vavá, que morreu em São Paulo Ricardo Stuckert Justiça negou pedido de Lula para ir ao velório do irmão, Vavá, que morreu em São Paulo No fim de 2018, o ex-presidente pleiteou a ida à cerimônia fúnebre do advogado e amigo Sigmaringa Seixas, mas o pedido foi negado pela Justiça Federal, em função na inexistência de grau de parentesco.
Em petição nesta terça, a defesa disse que agora Lula “cumpre os requisitos objetivos previstos em lei para a permissão de saída”. “A despeito da alegada proximidade existente, não está caracterizado o grau de parentesco necessário para ensejar a autorização de saída pleiteada”, escreveu, na época, o juiz de plantão Vicente de Paula Ataíde Júnior, ao fundamentar a negativa.
A defesa de Lula argumentou que a situação agora se enquadra no artigo 120 da Lei de Execução Penal, que prevê que condenados que cumprem pena em regime fechado “poderão obter permissão para sair do estabelecimento, mediante escolta, quando ocorrer um dos seguintes fatos: falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão”.
Os advogados Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins afirmaram que aspectos humanitários e a proteção constitucional dada à família tornavam “imperioso o acolhimento do pedido” de saída temporária. “É um pedido humanitário”, disse a advogada Isabel Kugler Mendes, presidente do Conselho da Comunidade de Curitiba, órgão de execução penal que atua para promover assistência ao preso.
O conselho também peticionou à Justiça, reiterando o pedido dos advogados de Lula. Um terceiro peticionante, Ricardo Luiz Ferreira, morador de São Paulo, ainda entrou com um pedido de habeas corpus no TRF da 4ª Região, no início da noite, para reforçar o pleito de saída temporária feito à Justiça Federal do Paraná. Esse pedido, porém, nem chegará a ser julgado.
“Não é nenhum privilégio, mas um direito, que é concedido a muitos presos provisórios rotineiramente”, afirmou à Folha a advogada Elisabete Subtil de Oliveira, que integra o Conselho da Comunidade. “É uma situação corriqueira, um pedido deferido dentro da maior normalidade na execução penal”, disse o advogado Alexandre Salomão, presidente da comissão de Direitos Humanos da OAB-PR.
Pelo menos um preso da Operação Lava Jato já obteve uma decisão favorável para acompanhar o enterro de um familiar: o ex-deputado baiano Luiz Argôlo, em agosto de 2017. A decisão, porém, foi da Justiça estadual, que era responsável pela sua execução penal. Durante a ditadura militar, quando foi preso após liderar uma greve, Lula conseguiu autorização da justiça para sair da cadeia e ir ao enterro de sua mãe em 1980.
Segundo o texto da Lei de Execução Penal, a permissão de saída deve ser concedida pelo diretor do estabelecimento penal onde se encontra o preso. Mas, na prática, diz o advogado criminalista Alessandro Silvério, os diretores delegam a decisão ao juiz de execução penal, a quem as defesas costumam dirigir o pedido, como fizeram os advogados de Lula.
Para ele, a possibilidade de saída dos presos para o velório e enterro de familiares é um direito, sim, do preso -desde que com escolta, como prevê a lei.
“Há uma construção jurisprudencial que impõe ao Estado esse ônus. Mas, se o Estado alegar que não tem escolta ou logística, pode criar um óbice para que ele não tenha reconhecido esse direito”, afirma Silvério.
O advogado João Rafael de Oliveira, professor de direito processual penal, diz que um dos princípios que orienta a execução penal é a dignidade da pessoa humana. “Sempre que possível, deve-se cumprir a máxima efetivação dos direitos do preso que estão na lei. E, entre eles, está a saída para o enterro de um familiar”, afirmou.
“É uma previsão legal. Mas a competência é do juiz.” O ex-presidente está detido desde abril de 2018, após ter sido condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá. Desde então, Lula só deixou a prisão uma única vez: ao prestar depoimento à juíza Gabriela Hardt, em novembro.
Em parecer, o Ministério Público Federal considerou que “a permissão de saída não se confunde com direito do preso”, e afirmou que há um “insuperável obstáculo técnico” para que se cumpra o pedido. “O custodiado não é um preso comum, e a logística para realizar a sua escolta depende de um tempo prévio de preparação e planejamento”, afirmaram os procuradores.
Fonte: FolhaPress