O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, apresentou nesta quarta-feira (9/5) duas propostas de súmulas vinculantes para estender a restrição do foro privilegiado para todas as autoridades, mas já há resistências ao texto. A ideia do ministro é que o novo entendimento adotado para deputados e senadores seja estendido para integrantes do Executivo e Judiciário, além de declarar inconstitucionais leis estaduais que protejam autoridades locais.
A proposta deve ser encaminhada para uma comissão responsável pela análise preliminar das propostas de súmulas e depois segue para julgamento dos ministros. Não há prazo para isso. O ministro argumenta que é preciso ampliar a nova regra do foro para evitar insegurança jurídica, deixando claro que membros e servidores dos Legislativo, Executivo e Judiciário só terão acesso ao foro para crimes praticados que compreenderem o exercício e em razão do cargo ou função públicos.
“A ausência de um regramento vinculante daria margem a uma multiplicidade de interpretações sobre o instituto da prerrogativa de foro”, escreveu o ministro.
Em relação ao presidente da República, no entanto, a Constituição estabelece que cabe ao STF receber denúncias ou queixa contra o chefe do Executivo e ele, durante o mandato, só pode ser responsabilizado criminalmente por atos relacionados ao exercício da função.
São duas as propostas do ministro: 1) Súmula vinculante: A competência por prerrogativa de foro, prevista na Constituição Federal para agentes públicos dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário e do MP, compreende exclusivamente os crimes praticados no exercício e em razão do cargo ou da função pública; 2) Súmula vinculante: São inconstitucionais normas de Constituições Estaduais e da Lei Orgânica do DF que contemplem hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na Constituição, vedada a invocação de simetria.
A súmula vinculante foi instituída a partir da inclusão do artigo 103-A na Constituição Federal por meio da EC 45/2004, que confere ao STF, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, a possibilidade de editar verbetes com efeito vinculante que contêm, de forma concisa, a jurisprudência consolidada da Corte sobre determinada matéria.
A edição, o cancelamento e a revisão de súmulas vinculantes têm de ser aprovados por, no mínimo, oito ministros do STF, o equivalente a dois terços da composição da Corte, após manifestação do procurador-geral da República. O objetivo desse instrumento processual é impedir que juízes de outras instâncias da Justiça brasileira decidam de forma diferente da jurisprudência firmada no STF.
Reações
Nos bastidores, os ministros que venceram o julgamento do foro de congressistas minimizaram a proposta de súmula vinculante levantada por Toffoli. “É a mesma que ele perdeu?”, desdenhou um ministro em referência ao fato de o colega ter feito a mesma proposta em seu voto sobre o foro. Também reservadamente, um ministro que votou por uma restrição menor ao foro também criticou a iniciativa de Toffoli, sob argumento de que deve haver diversos precedentes no mesmo sentido para justificar a edição de uma súmula.
Para o ministro Marco Aurélio, apesar de o STF ter restringido o foro privilegiado apenas para parlamentares federais, a interpretação vale para todas as autoridades com foro por prerrogativa de função. “O sistema é orgânico. Não há dúvida, tanto que o ministro Luis Felipe Salomão já decidiu. Quer dizer, a sinalização não é só do Supremo como do STJ”, afirmou.
Luiz Fux disse que vê dificuldade para que a proposta avance. Segundo o ministro, é necessário um julgamento de casos referentes a outras categorias para se chegar a uma conclusão global e fixar súmula. “A lei não permite que no caso “A” fixe tese no caso “X” então haveria dissintonia entre a tese e o caso julgado [foro parlamentar]”, disse. Para Fux, melhor seria esperar uma definição do Legislativo sobre a questão. “Acho que a melhor opção é deferência ao Legislativo, que é a sede própria para votar emenda e solucionar questão. Não pode ser fixada de parte atropelada. “
Números
Toffoli cita que são 38.431 autoridades federais, estaduais, distritais e municipais detentoras de prerrogativa de foro por determinação da Constituição Federal e outras 16.559 autoridades estaduais, distritais e municipais com prerrogativa de foro junto a tribunais locais outorgadas exclusivamente por Constituições Estaduais ou pela Lei Orgânica do DF.
“Esse expressivo número de autoridades detentoras de prerrogativa de foro, sem paralelo, no Direito Comparado, em nenhuma democracia consolidada que consagre a prerrogativa de foro com a abrangência como a da brasileira, evidencia o potencial de conflitos de competência que podem se estabelecer entre as diversas instâncias do Judiciário”, argumentou o ministro.
No julgamento da semana passada que definiu limite para a prerrogativa dos congressistas, Toffoli chegou a fazer um ajuste em seu voto para que todas as autoridades tivessem o mesmo tratamento. O ministro tem defendido que é preciso dar um tratamento isonômico.
“Nossa decisão suscitará questionamentos sobre outros detentores. Vou fazer adendo e retificação do meu voto no sentido de trazer alguns balizamentos em relação a outros cargos e funções no que pertine a aplicação ou não do foro. Tendo em vista a ideia de isonomia, não podemos somente restringir foro aos parlamentares. Temos então de aplicar essa interpretação a todos enquanto tenham foro de prerrogativa”, disse durante o julgamento.
Na análise dos casos dos parlamentares, Toffoli se juntou a divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes para que fiquem na Corte todos crimes cometidos após a diplomação como congressista. A tese do ministro de ampliar a limitação do foro foi seguida por Gilmar Mendes. O entendimento da maioria, foi no sentido de restringir o foro por prerrogativa de função a crimes cometidos durante o exercício do mandato e relacionado às funções desempenhadas pelo agente público.
O caminho da súmula (regimento interno do STF):
Art. 354-a. Recebendo proposta de edição, revisão ou cancelamento de Súmula Vinculante, a Secretaria Judiciária a autuará e registrará ao Presidente, para apreciação, no prazo de 5 (cinco) dias, quanto à adequação formal da proposta.
Art. 354-b. Verificado o atendimento dos requisitos formais, a Secretaria Judiciária publicará edital no sítio do Tribunal e no Diário da Justiça Eletrônico, para ciência e manifestação de interessados no prazo de 5 (cinco) dias, encaminhando a seguir os autos ao Procurador-Geral da República.
Art. 354-c. Devolvidos os autos com a manifestação do Procurador-Geral da República, o Presidente submeterá as manifestações e a proposta de edição, revisão ou cancelamento de Súmula aos Ministros da Comissão de Jurisprudência, em meio eletrônico, para que se manifestem no prazo comum de 15 (quinze dias); decorrido o prazo, a proposta, com ou sem manifestação, será submetida, também por meio eletrônico, aos demais Ministros, pelo mesmo prazo comum.
Art. 354-d. Decorrido o prazo do art. 354-C, o Presidente submeterá a proposta à deliberação do Tribunal Pleno, mediante inclusão em pauta.
FONTE: Jota.Info